ELIAS RICARDO SANDE

ELIAS RICARDO SANDE
PSICOLOGO SOCIAL E DAS ORGANIZACOES

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Espiritos Vivos: Perspectiva Africana


  1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho, realizado no âmbito da cadeira de Perspectivas Africanas e Fenómenos Psicológicos, surge com o objectivo de abordar os conceitos ligados ao espírito, à interpretação deste conceito na cultura Moçambicana e em outros contextos culturais.

Importa abordar este tema, uma vez que a possessão pelos espíritos é tida como um fenómeno praticado somente em comunidades não civilizadas, porém este facto não constitui a verdade. Não só em África mas também no Ocidente pode-se verificar a possessão e o posterior exorcismo.

Estruturalmente o trabalho apresenta três partes: introdução que versa sobre o objectivo do trabalho, o desenvolvimento aborda as várias vertentes da manifestação dos espíritos e a conclusão que faz a síntese do trabalho.

A metodologia usada para a elaboração do trabalho foi a revisão bibliográfica e busca de alguns sites electrónicos.

O grupo enfrentou dificuldades na elaboração do trabalho devido à falta de bibliografia que aborde sobre o conceito de espírito em Psicologia.



  1. CONCEITOS-CHAVE
Espírito- a palavra espírito apresenta diferentes significados. O espírito tem raíz etimológica do latim “spiritus” significando “respiração” ou “sopro”, mas também pode estar-se referindo à “alma”, “coragem” e ao “vigor” (http://www.gforum.tv/board/1655/244609/significado-da-palavra-espirito-e-conceito-de-espiritismo.html).

Em Psicologia, o espírito designa “atitude mental” dominante de uma pessoa ou de um grupo que motiva-o a fazer ou a dizer coisas de um determinado modo.

Espiritologia- de acordo com a espiritologia (ou “psicologia espiritual”), o espírito é o corpo psíquico, que entra em contacto com a quarta dimensão (ou Mundo Astral), local onde não existe problemas de espaço (distâncias) ou de tempo. Segundo esta corrente, o ser humano pode entrar em contacto com outros lugares ou até outras épocas, sendo que, alguns pesquisadores, como o psiquiatra suiço Carl Gustav Jung, acreditavam que os problemas do mundo contemporâneo, não eram regidos apenas pelas pessoas fisicamente, mas também psiquicamente, utilizando o mundo astral como meio de interesse no Mundo Terrestre.







  1. ESPÍRITOS
A possessão pelos espíritos entende-se como um estado particular em que o indivíduo experimenta a separação temporária da sua própria essência e identidade.
Firth (1959) citado por Honwana (2002), apresenta uma definição mais elaborada, considerando a posse pelos espíritos como “uma forma de transe em que as acções comportamentais de uma pessoa são interpretados como prova de controlo do seu comportamento por um espírito normalmente exterior a si próprio”.
Beattie e Middleten (1969) citado por Honwana (2002), acrescentam a esta definição a ideia de que a possessão pelos espíritos pode incluir um transe tanto “real “como” “presumido”.
Alguns informantes afirmavam-se possuídos, mas não realçavam que os seus espíritos não “saem” e “falam”, apenas os “iluminam” no desempenho das suas funções ou através de sonhos e visões.

3.1. A DIFERENÇA ENTRE POSSE PELOS ESPÍRITOS E XAMANISMO
Xamanismo – é um fenómeno frequente na América Latina e na Ásia, refere –se à ausência temporária da alma do indivíduo, que deixa o corpo e parte para combater os poderes que provocam doença e desgraça.
Entende-se a posse pelos espíritos como entrada de uma alma externa no corpo de um indivíduo, apoderando-se da sua personalidade e das suas acções.
Os dois processos são vistos como antitéticos, sendo o primeiro como uma descida dos espíritos sobre o indivíduo, e o segundo como uma ascensão do indivíduo até aos espíritos.

Outros pontos de vista sugerem que ambos os fenómenos fazem parte do mesmo processo e ocorrem em conjunto, pois o xamanismo também implica uma possessão pelos espíritos controlada, ou seja o controlo pelo indivíduo, dos seus espíritos, que ele pode invocar à vontade para efeitos de comunicação e de resolução de problemas.

    1. SIGNIFICADO DA POSSESSÃO PELOS ESPÍRITOS
Quando alguém morre o seu corpo é enterrado, crê-se que o seu espiríto permanece como manifestação do seu poder, personalidade e conhecimento na sociedade. Os espíritos dos mortos exercem uma poderosa influência sobre os vivos e por isso, para que haja harmonia, os indivíduos têm que os acomodar e seguir a sua vontade.
Os espíritos mais importantes são os dois anciãos, os que em vida detinham posições superiores. Daí que os espíritos das crianças e jovens não possuíam o mesmo estatuto dos espíritos das pessoas mais idosas.
A relação ainê-cadet é transmitida para o mundo dos espíritos ou, por outras palavras, o mundo espiritual é uma continuidade do mundo dos vivos, no sentido em que mesmo após a morte, os mais velhos continuam a orientar os seus descendentes.
Svikwembu é a palavra tsonga utilizada para designar os espíritos. Etimologicamente, esta palavra é composta por dois elementos: Swi, para o plural e o xikwembu significa Deus ou espírito.
Junod (1927:333) citado por Honwana (2002:53), sugere que o termo xikwembu deriva da palavra vukwembu que quer dizer << a coisa que cria a vida e provoca a morte, que dá riqueza ou pobreza>>.
Os espíritos são deuses, são responsáveis pela fertilidade da terra e das mulheres, dão saúde e riqueza ou doença e pobreza.
Acredita-se que os espíritos, tal como os bebés, encontram-se mais próximos da natureza. Não têm uma consiência social humana, por isso não se pode discutir com eles. Tal como os bebés os espíritos têm que ser tratados com carinho e amor, são como antepassado que regressa a vida.
Por um lado, enquanto o nascimento representa a reprodução fisíca do grupo, a posse pelos espíritos poderá significar a reprodução social das comunidades (reprodução da ordem social, dos valores morais e sociais).
Tinyanga (ou nyanga-singular) é o termo tsonga para designar todos os indivíduos, possuídos ou não pelos espíritos, que tratam da doença e da desgraça nas comunidades; participante da medicina tradicional, conhecido por curandeiros não possuídos pelos espíritos.
Nyangarume, possuídos pelos espíritos tinguluve (também conhecido por mablonga) e especialistas em medicina à base de plantas para adivinharem, curarem e combaterem a magia e a feitiçaria, mas sem entrarem em transe.

    1. A ENCARNAÇÃO DE ESPÍRITOS NÃO-LINHAGEIROS
Os Vanyamusoro (plural) são famosos por conseguirem resolver diversos tipos de problemas. As pessoas consultam-nos para se curarem de doenças, procurarem protecção contra desgraças da vida, para descobrirem as causas da morte de um familiar ou mesmo para saberem a razão porque os animais domésticos estão a morrer e a produção agrícola vai bem. As pessoas recorrem aos poderes dos vanyamusoro sobretudo para conhecerem o porquê de tais acontecimentos e a maneira de reequilibrarem a sua vida.
    1. RELAÇÃO ENTRE SERES ESPIRITUAIS
As relações que se estabelecem entre espíritos linhageiros tinguluve e os espíritos não linhageiros vanguni e vandau coabitam o mesmo indivíduo.
A coabitação de três seres espirituais diferentes no corpo do mesmo indivíduo dá origem ao nyamusoro. As três categorias de espíritos que possuem o nyamusoro têm função e poderes específicos: os poderes de adivinhação pelos tinholos (ossículos de adivinhação), fornecidos pelos espíritos vanguni, os poderes do exorcismo kufemba providenciado pelos espíritos vandau.
A grande tendência teórica indica que a possessão se encontra associada mais à mulher por estar mais ligada ao lar, à aldeia e, consequentemente à cultura tradicional do que ao homem, que sai da comunidade para trabalhar. Este facto poderá levar a uma incidência de um individuo do sexo feminino possuído no Sul de Moçambique.

    1. A RELAÇÃO ENTRE HOSPEDEIRO E ESPÍRITOS
Quem pode ser nyamusoro?
O poder ancestral é uma herança: tem que ter existido nyamusoro na família, cujos espíritos escolhem um dos membros para prosseguir com a tradição. Eles fazem a selecção entre a família consanguínea, independentemente do sexo, idade ou geração. Esta é a forma mais comum e mais legitimada de aquisição do poder espiritual dos antepassados.
Existem outras formas: pode ser apanhado por espíritos no meio ambiente ou pisando o local onde jaz um morto que não tenha tido um enterro condigno, ou ainda comprando (por preços elevados, o que inclui por vezes, a morte de um familiar directo), os poderes e o conhecimento de um nyamusoro.
Esta última forma de aquisição é considerada incompleta e sem a benção dos espíritos ancestrais e, por consequência, sem eficácia.
... Tanto os que compram como os que vendem estão a agir contra as normas, contra a vontade dos antepassados. Ambos são movidos pela ambição de ganhar dinheiro enganando as pessoa.”
  1. A DOENÇA DO CHAMAMENTO
O processo de transformação em nyamusoro começa com uma doença muito grave, como se as pessoas estivessem quase a morrer. Esta doença de <<chamamento>> parece existir em todo o continente. Devisch (sd), citado por Honwana (2002:87), identifica o mesmo fenómeno entre os yaka do Zaire, dizendo que <<... alguns meses antes depois da morte de um adivinho, um dos seus descendentes uterinos começa a ter um comportamento estranho, padecendo de emagrecimento permanente>>.
A doença da eleição, que afecta o futuro nyamusoro, pode representar uma luta de poder entre o indivíduo e os espíritos possuidores pelo controlo do corpo e da personalidade.
A possessão pelos espíritos é um processo violento, que implica o deslocamento temporário da alma (ou essência) do indivíduo e a consequente substituição pela alma de outrem.
Através da possessão, o individuo ascende a uma posição superior ao comum dos seres humanos, ficando mais próximo do mundo dos espíritos dos antepassados.
A doença da eleição representa, a mente simbólica da identidade presente do individuo para possibilitar o seu renascimento numa nova dimensão, com uma personalidade de identidades novas. Esta morte simbólica parece ser condição fundamental para aquisição do poder ancestral (Augé, 1977) citado por Honwana (2002:82).

    1. KUTHWASA: O PROCESSO DE INICIAÇÃO
Logo que um adivinho lhe diagnostica a doença do <<chamamento>>, o indivíduo tem que ser iniciado por um nyamusoro-mestre numa <<escola>> para nyamusoro. Os candidatos são levados para estas escolas por familiares e poderão ir mudando de escola até encontrarem um mestre capaz de lidar com os seus espíritos. E isto deve ao facto de alguns espíritos serem mais fortes do que outros; deste modo se os espíritos do mestre forem mais fracos que os do aprendiz, ele não os pode iniciar.
Existem casos que não precisam de ser levados para a escola por familiares e não tem que tentar encontrar o mestre adequado, em virtude de os espíritos se encarregarem de tudo: mostram aos candidatos o caminho para escola de um determinado nyamusoro-mestre que tratará deles e os iniciará.
A iniciação do nyamusoro realiza-se em casa do mestre onde vivem dois anos ou mais, consoante a duração da iniciação, sendo a média de 2 a 3 anos. Esta duração contrasta-se com outras sociedades em que a iniciação dura apenas semanas, meses ou no máximo um ano.
No Sul de Moçambique, os indivíduos têm que se preparar para dedicar cerca de três anos da sua vida à <<escola>> de iniciação, isolados do contacto social com a família e os amigos.
Na escola dos vanyamusoro os iniciados são denominados mathuasana (os que fazem kuthwasa) e tratam o mestre por b´ava (pai). Durante esse período aprendem a aceitar a situação de possuídos por espíritos: como viver com os espíritos no corpo, como comunicar com eles e como usar os seus poderes para proteger e curar a comunidade.
O pagamento da primeira consulta após a iniciação, por exemplo, tem que ser oferecido ao nyamusoro-mestre, em sinal de gratidão pelos seus serviços. Existem ainda normas de conduta ou ética de profissão, que se devem observar. Exemplo: o seu conhecimento não deve ser usado para responder às suas próprias ambições ou para benefício exclusivo; não deve ser usado para fazer mal às outras pessoas ; deve ser usado para praticar o bem (curar e proteger a comunidade) e não o mal (feitiçaria e magia).

    1. RITUAIS DE CONFIRMAÇÃO
No final da iniciação os mathuwasana são submetidos aos rituais de confirmação: o kuthwasa, que se destina aos espíritos vanguni e o kuparura, dirigidos aos espíritos vandau. Os que terminam estes rituais com êxito deixam de ser mathwasana para se tornarem nyamusoro.
Os rituais de confirmação são uma ocasião importante para a comunidade. Pais, familiares, amigos e vizinhos participam para testemunhar o sucesso ou insucesso dos iniciados. Esta poderá se também a maneira de legitimarem o processo de iniciação assim como as capacidades do mestre e das práticas recém-formadas.
A participação e o envolvimento da família, amigos e vizinhos na iniciação do nyamusoro indica claramente que, como instituição, ela não é marginal nem periférica relativamente à sociedade. A família dos iniciados envolve-se activamente no pagamento das taxas da iniciação na aquisição de insígnias e parafernálias de animais para o sacrifício, comidas e bebidas para os rituais, na organização e provisão para o ritual Kubeleketa e por aí fora. Também tomam parte nos rituais de confirmação cantando batendo palmas e dançando.
Os vanyamusoro recém-graduados são reintegrados na comunidade e adquirem uma nova posição social. Estabelecem a ligação entre os vivos e os espíritos dos antepassados.

  1. POSSESSÕES
A possessão é tida como uma “doença” no domínio da medicina, também chamada de <<loucura dos deuses>> (vuvavyi bza svikwembu). Tem também carácter religioso, pois os espíritos tidos como causadores da doença são svikwembu, espíritos dos falecidos, aos quais se deve prestar culto. Os ritos relativos ao tratamento desta “doença” são mágicos e quem dela sofre torna-se muitas vezes, curandeiro e atribui-se poder sobrenatural.
Os fenómenos de possessão existem na maior parte das raças não civilizadas e até em povos mais avançados. Segundo Junod (1996), a doença espalhou-se enormemente entre os Tsongas no último quarto do século passado, porém as possessões são mais frequentes nos Rhongas do que nos clãs do Norte.

    1. OS ESPÍRITOS QUE CAUSAM A DOENÇA
Os espíritos a quem se atribui o poder da possessão são os espíritos Zulus e os da Tribo dos Ndrawus, os que habitam o país além do Save até os arredores da Beira. As primeiras possessões que se manifestaram eram devidas aos espíritos dos Zulus e dos Ngonis; que possivelmente coincidiram com a invasão dos guerreiros de Manukuse e com o êxodo crescente de mancebos para as cidades, quando iam trabalhar nas minas de diamantes de Kimberley ou nas minas de ouro de Johanesburgo, atravessando assim nas suas viagens territórios ocupados pelos Zulus. Quanto aos espíritos Ndrawus, são algumas vezes chamados amandiki diz-se seguiram os guerreiros tsongas e ngonis do Nghunghunyane que se estabeleceram, por alguns anos, na Musapa, em pleno país ndrawu, ao norte do Save.
Quando a guerra de 1894 a 1895 obrigou a fuga dos Rhongas do norte, os de Mavota, Zihlahla e Nondrwana, eles levaram consigo, os espíritos que os tinham possuído e <<disseminaram-nos>> nos países do norte, de forma que ao regressar à casa não foram mais molestados por esses svikwembu.
As possessões pelos Ndrawus parecem ser mais perigosas que as dos Zulus. Vundrawu bza kareta, a <<possessão ndrawu é dolorosa>>. Se as encantações são feitas em zulu para as possessões dos zulus, fazem-se em língua ndrawu quando são causadas pelos espíritos ndrawu.

    1. COMEÇO E DIAGNÓSTICO DA DOENÇA
Junod (1996), apresenta vários exemplos de estudos da sua obra (Bulletin de la Societé Neuchâteloise de Geographie, tomo X, pág. 388), que efectuou sobre histórias de casos de possessão entre os Rhongas. A maior parte deles começam por uma crise muito distinta, em que o paciente fica inconsciente; não parece, no entanto, que esta inconsciência tenha sido causada por perturbações nervosas. Um primeiro exemplo é a história de N’waxin’hwana, uma mulher dos arredores de Lourenço Marques que fugiu de casa e atirou-se ao mar; o contacto com a água fria fê-la retomar os sentidos; depois, os ossículos declararam que ela tinha svikwembu. Havia nela uma multidão de ocupantes, entre os quais seu próprio filho Manuel, falecido algum tempo antes.
A segunda história é sobre Mboza, que esteve possesso ele próprio e mais tarde tornou-se um verdadeiro exorcista. Depois de ter trabalhado nas minas de Kimberley por algum tempo, regressou à casa de boa saúde. Pouco tempo depois, começou a coxear e assim andou seis meses. Atribuía a reumatismo (xifambu) a dificuldade que tinha de andar. Melhorou, mas começaram a manifestar-se outros sintomas. Perdia o apetite; em breve deixou de comer, quase por completo. Apresenta-se aqui a sua declaração:
<<Um dia fui com outro homem apanhar juncos para fazer uma esteira; de repente, os svikwembu começaram em mim (ndri sunguleka hi svikwembu xikan’we). Voltei à aldeia com todos os membros frementes. Entrei na palhota mas, de repente, saltei e pus-me a atacar as pessoas da aldeia. Depois fugi, seguido pelos meus amigos. Estes agarraram-me e imediatamente os espíritos dispersaram-se (hangalaka). Voltado a mim, soube que tinha ferido um khehla (homem de coroa de cera) e batido nas costas de outras duas pessoas. Há! – disseram eles- Ani svikwembu! (Ele tem os deuses, ou ele está doente dos deuses).>>
Parece que os primeiros sinais de possessão são a crise nervosa e também a aparição de certos sintomas suspeitos: uma dor persistente no peito, um soluço impossível de reprimir, bocejos desacostumados, emagrecimento sem causa aparente, etc. Porém, só é tirada a conclusão depois que se consulta os ossículos. Para efectuar o tratamento há médicos indígenas especializados nesta doença, não são n’anga; chamam-se govela.

5.3.O TRATAMENTO DAS POSSESSÕES OU EXORCISMO
Outrora o único remédio consistia em baloiçar diante do paciente uma grande folha de palmeira (milala), que se acreditava bastante que dispersava os espíritos. Agora o tratamento é mais complicado e, embora varie entre as escolas de tratamento, compreende quatro ritos principais:
  • O toque dos tambores (gongondrela);
  • A ablução na cabaça govo (vasela);
  • A absorção do sangue duma vítima;
  • A cerimónia do hondlola;

O toque dos tambores- é um rito que produz um barulho infernal que o possesso tem de sofrer. Primeiro os ossículos têm de ser consultados para indicarem o local onde será efectuado o sabbat. Se o ossículo que representa o paciente cai no meio dos outros, quer dizer que os tamborins devem ser tocados no interior da palhota; se cai longe, no limiar da porta, mais longe que os outros quer dizer que o sabbat será feito no mato, muito longe da aldeia. Se os ossículos nada revelam, há que deitá-los novamente, atrás da palhota ou na praça da aldeia até que falem. Se as quatro conchas Olivas e Cipreias que fazem parte dos ossículos caem sobre o dorso, com a abertura à vista, isto significa que os deuses da possessão, ir-se-ão embora; ao passo que se as conchas caem pelo lado convexo, o adivinho dirá: Matikarata ntsena- <<Todos os vossos esforços são em vão>>. O sabbat não terá efeito e os espíritos não encontrarão a porta de saída.

O rito da bacia govo- prepara-se certa raiz, o phuphumana; mergulha-se na água duma grande cabaça, cortada em duas de maneira a formar uma coveta; mexe-se a mistura, produzindo-se uma espuma branca abundante, com a qual o paciente deve lavar-se ou, então, tendo a coveta sobre os joelhos, toma um pouco da espuma entre os lábios e sopra-as aos quatro ventos, fazendo pthu. É um meio preliminar de ganhar o favor dos espíritos possessores.

Absorção do sangue de uma vítima- os espíritos, exprimindo-se pela boca do paciente, reclamam presentes. É derramado o sangue de uma galinha em alguns ritos, sangue abundante, para a cura do paciente e obter do espírito possessor a garantia de que não mais o importunará. Na maior parte das escolas é oferecido ao espírito uma cabra se o paciente for homem e um bode, se o paciente for uma mulher. Fere-se o animal na nascença da perna, o paciente lança-se sobre o ferimento e suga com avidez sangue até ter o estômago cheio. Quando saciado, arranca-se o paciente do animal, com uma pena faz-se cócegas no paciente para que retire-se para trás da palhota e vomite o sangue que bebeu. Desta forma, o espírito ou espíritos ficam devidamente apaziguados e expulsos.

Cerimónia de hondlola- o hondlola ou levantamento da poluição da doença é necessário no fim de todas as doenças. Desde que o pocesso é declarado curado, tem de se cumprir esse rito com uma condição, porém: que o possesso, homem ou mulher, tenha observado a lei da abstinência, durante toda a duração da convalescença. Verifica-se se esta regra foi cumprida colocando uma galinha em cima da cabeça do paciente. Se o doente foi abstinente, o animal ficará quieto, não levantará voo, ainda que alguém aproxime-se dele. Mas se a ave voa com grande barulho o exorcista, despede-se dizendo: <<pecaste e, procedendo assim, arruinaste o efeito das minhas raízes (mihonile murhi). Se pelo contrário, a ave permanece tranquila, a regra foi cumprida. Mata-se a galinha e o seu sangue será usado no rito de hondlola, no momento da fricção. Em seguida é depenada e comida pelos habitantes da aldeia mas o paciente e o seu cônjuge, assim como o exorcista chefe, nao lhe tocarão. Apartir deste momento, marido e mulher estão autorizados a viver juntos, como anteriormente.
O hondlola, significa não só a reintrodução do paciente na sociedade das pessoas saudáveis como também a sua recepção na sociedade dos exorcistas.

O grupo tem a opinião que nem todos os espíritos possuem o indivíduo como acto de maldade. Outras vezes a possessão tem como objectivo chamar a atenção aos vivos, quando o espírito sente-se esquecido, no caso espíritos familiares (dzindza).






  1. CONCLUSÃO
Em linhas gerais, podemos concluir que o espírito apresenta diferentes significados. O espírito tem raíz etimológica do latim “spiritus” significando “respiração” ou “sopro”, mas também pode estar-se referindo à “alma”, “coragem” e ao “vigor”.
A possessão pelos espíritos é um processo que não se verifica somente em Moçambique, mas acontece também em todo o continente africano assim como na América Latina e na Ásia.

Os termos usados para designar esse processo inerente à possessão variam de cultura para cultura.

A possessão é um fenómeno oculto e um tanto assustador que exige um tratamento extremamente complicado, realizado por pessoas conhecedoras de tais ritos e da tradição.






  1. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS







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