ELIAS RICARDO SANDE

ELIAS RICARDO SANDE
PSICOLOGO SOCIAL E DAS ORGANIZACOES

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Conceito de Doenca na perspectiva africana


INDICE

















1. Introdução


O presente trabalho surge no âmbito da cadeira de Perspectivas Africanas dos Fenómenos Psicológicos, e tem como tema: Doença.
A saúde, a doença e os processos de cura são construções sociais, resultante de um processo complexo que integra factores biológicos, socio-economicos, culturais, psicossociais e religiosos, que permitem o contexto da história da vida das pessoas e exercem muita influência nas suas atitudes face a doenca e aos processos de cura.
As diferenças culturais, julgamentos subjectivos afectam o modo como a doença é definida. Sendo assim, entende-se por doença um estado no qual a pessoa está mal ajustada, por vezes a pessoa pode ficar sem vontade de auto-realizar-se devido a sua doença.
O objectivo é descrever a doença no contextro ocidental, em primeiro lugar e Moçambicano em segundo lugar trazendo a concepção do que ela é.
O trabalho compreende a seguinte estrutura: a introdução; a denicição de conceitos, onde falaremos dos modelos biomédico e biopsicossocial; a visão de Freud, a doença na perspectiva tradicional e por fim a conclusão.
Para a realização do trabalho foi usada a revisão bibliográfica e consulta de sites na internet.









2. Definição de conceitos

Antes de falarmos da doença temos que inicialmente compreender o que é saúde.
Marques (s/d) refere que a Organização Mundial de Saúde define a saúde como o bem estar físico, psíquico, social e espiritual.
A partir deste conceito podemos compreender que a saúde não é apenas ausência de uma doença ou enfermidade, mas, o bom funcionamento de todos os elementos envolvido na interação do indivíduo consigo mesmo e com o seu ambiente familiar e social. Entretanto, Albuquerque & Oliveira (s/d) referem que a saúde e doença não são estados ou condições estáveis, mas sim conceitos vitais, sujeitos a constante avaliação e mudança. Num passado ainda recente a doença era frequentemente definida como "ausência de saúde", sendo a saúde definida como "ausência de doença" - definições que não eram esclarecedoras. Algumas autoridades encararam a doença e a saúde como estados de desconforto físico ou de bem-estar.
Assim, após a apresentação de noção da saúde passamos a apresentar o conceito de doença.
Para Santiago (2006) a doença é um nome que se dá a todo um conjunto de sinais e sintomas que o corpo ou a pessoa apresenta. O nome da doença é dado em função dos sinais e sintomas que a pessoa apresenta de forma a reflectir esses mesmos sinais e sintomas. Para identificar uma doença há que conhecer os seus sinais e sintomas e tem de se ter um bom conhecimento acerca disso para se conseguir determinar exactamente qual é a doença existente uma vez que muitas doenças têm sinais e sintomas comuns e/ou idênticos.

2.1 Modelos de definição da Doença

O conceito de doença pode ser visto tendo em conta dois modelos: Biomédica e Biopsicossocial.
  • Modelo Biomédico
Para Assis (s/d) este modelo define a doença como desajustamento ou falha nos mecanismos de adaptação do organismo ou uma ausência de reação aos estímulos cuja acção está exposto. O conceito de doença é abordado a partir de duas perspectivas:
    • Patologia – Valoriza o mecanismo causador das doenças.
      • Infecciosas;
      • Não-infecciosas.
    • Clínica Médica – Privilegia uma abordagem terapêutica de sinais e sintomas.
      • Crônicas;
      • Agudas.
Por outro lado, Gonçalves (s/d) refere que no modelo biomédico a doença é explicada meramente como fenómeno fisiológico. É a alteração dos parâmetros biológicos, somáticos que define a doença. Sendo assim, a doença resulta de perturbações fisiológicas causadas por imperfeições genéticas, desiquilíbrios bioquímicos ou ainda por danos provocados por agentes físicos (por exemplo, radiações) ou agentes biológicos (por exemplo, bactérias, virus).
Porém, nos últimos anos, este modelo redutor, de quem vê a doença, o órgão e desvaloriza as ramificações pessoais, familiares, sociais e culturais foi sendo contestado fazendo emergir um modelo holístico (biopsicossocial).

  • Modelo Biopsicossocial

A doença é uma combinação de factores: culturais, orgânicos, comportamentais, económicos, físicos e familiares, o indivíduo não é mais encarado como vítima passivo do meio, os indivíduos são responsáveis pelo seu próprio estado de saúde.
Portanto, segundo Goçalves (s/d), os sintomas são importante em si mesmo. A doença é vista como pertencente a uma pessoa que é parte integrante de um sistema de unidades organizadas hierarquicamente, do átomo à célula, do órgão do sistema, do corpo ao indivíduo, do indivíduo à família, da cultura ao universo, unidas por um sistema de regulação. Nesta perspectiva, a saúde e a doença são também vistos como processos dinâmicos, em evolução constante, e explicados por uma multicausalidade em que para além das variáveis biológicas individuais, entam igualmente as sociocultiaris, facto que sublinha a construção social.

Entretanto, pode se referir que o modelo biopsicossocial representou uma tentativa para integrar os factores psicológico (psico) e o meio ambiente (social) no modelo biomedico (bio).
  • Factores biológicos – aqui a doença é vista como uma predisposição genética e os processos de mutação que determinam o desenvolvimento corporal em geral, o funcionamento do organismo e o metabolismo. Vírus, bactérias, defeitos estruturais.
  • Factores psicológicos - aqui a doença é vista como preferências, expectativas, e medos, reacções emocionais, processos cognitivos e interpretações das cognições.
Os factores psicológicos da saúde e da doença eram descritos ao nível da cognições (por exemplo, expectativas acerca da saúde), emoções (por exemplo, medo de tratamento) e comportamento (por exemplo, fumar, fazer dieta, fazer exercícios ou consumo de álcool).
  • Factores socioculturais - a doença é vista como a presença de outras pessoas, expectativas das pessoas e do meio cultural, influência do ciclo familiar, de amigos, modelos de papéis sociais.

Segundo Stela citado por Ribeiro (1996:72), a resposta do paciente a sua doença precisa ser compreendida dentro da dinâmica biopsicossocial por ele vivenciada, visto que a doença não se constitui numa entidade isolada, mas num complexo processo que abrange actividades de natureza psicológica, envolve elementos biológicos e factores do contexto sociocultural.
Assim, sendo a doença vista como o resultado de uma combinação de factores, o indivíduo já não é encarado como uma vítima passiva.

3. A Visão de doença em Freud


Freud é pai da teoria psicanalítica. Segundo Peixoto (2008) a perspectiva psicanalítica de Freud surgiu no início do século XX, dando especial importância às forças inconscientes que motivam o comportamento humano. Freud, baseado na sua experiência clínica, acreditava que a fonte das perturbações emocionais residia nas experiências traumáticas reprimidas nos primeiros anos de vida. Desta forma, assumia que os conteúdos inconscientes, apenas se encontravam disponíveis para a consciência, de forma disfarçada (através de sonhos e lapsos de linguagem, por exemplo).

Para acrescentar esta ideia Psicanalítica, Mwamwenda (2003:272) refere que o objectivo principal da psicanálise era lidar com pessoas emocionalmente perturbadas e, assim, ao contrário de outras escolas de pensamento, a visão psicanalítica da personalidade era baseada em evidências recolhidas a partir da psicologia do anómalo. Freud começou seu estudo do comportamento humano utilizando a hipnose que ele acreditava ser eficaz na obtenção do insight dos problemas comportamentais do sujeito. Mais tarde ele achou que havia necessidade de um método melhor que permitisse aos pacientes uma maior compreensão da natureza dos seus problemas, então introduziu a que ele se referia como livre associação, na qual o paciente era convidado e encorajado a expressar tudo que viesse a sua mente independentemente de ser agradável ou desagradável.

Silva (2002) refere que Freud considerava a história do indivíduo, e dava importância a doença no passado do sujeito. Sendo assim, para o tratamento das doenças mentais Freud usava a regressão como fuga do presente, através da irrealização do presente. Segundo Freud, a irrealização do presente se caracterizava como uma fuga para defender-se do passado insuportável. Além disso, refere que o sujeito reproduz sua história respondendo uma situação presente através dos sintomas. Não consegue, porém, efectivar esse presente, ficando preso no seu passado patológico. A defesa como o presente torna-se uma necessidade, pois ele não consegue realiza-lo e a solução que o indivíduo encontra é a defesa. E a partir desse presente é preciso compreender e dar sentido as regressões evolutivas que surgem nas boas condutas evolutivas.
Segundo Freud citado por Scott (2003) os ataques epilépticos são confundido a histeria, pois, a suposta epilepsia de Dostoyevski seria acometido, é questionada por Freud que entende os ataques deste como resultados de uma identificação histérica com o pai morto. Implicada nesta interpretacao, está a questão da culpa pelo assassinato do pai. Os problemas por causa da morte que eram considerados, por sua manifestação mais aparente, como ataques epilépticos, gravem ataques de convulsões musculares, acompanhados de perda de consciência, seguidos de profunda depressão. Nesse ponto, Freud faz distinção entre a epilepsia como um mal do cérebro e os ataques de Dostoyevski como manifestações histéricas. Se a epilepsia de Dostoyevski pudesse ser admitida, ela deveria ser classificada então, como epilepsia afectiva e não orgânica.

Laerte M. Santos (s/d) Freud demonstrou que o homem não é apenas um ser racional. Há impulsos irracionais que nos influenciam. Estes impulsos irracionais se manifestam através do INCONSCIENTE.
Como refere Peixoto (2008) o Inconsciente – refere-se ao material não disponível a consciência ou ao escrutíneo do indivíduo. No entanto, o ponto nuclear da abordagem psicanalítica de Freud é a convicção da existência do inconsciente como:
  • Um receptáculo de lembranças traumáticas reprimidas;
  • Um reservatório de impulsos que constituem fonte de ansiendade, por serem socialmente ou eticamente inaceitáveis para o indivíduo.


4. Doença na perspectiva tradicional


De acordo com Feliciano (s/d) os sistemas tradicionais de saúde em Moçambique, como noutros países, estruturam-se pelo referido campo simbólico e articulam, por isso, família, economia, politica, religião, magia e feitiçaria. É por ele que se modelam as representações e as práticas da saúde e doença. A doença é representada como um efeito produzido pela desordem em qualquer um dos processos dos seus diferentes domínios.
Prevenir a doença ou cuidar dela é também um processo que implica agir simbolicamente através de algumas dessas classificações, para induzir efeitos no registo da saúde.
O sistema de saúde tradicional é gerido por diversos peritos, é enquadrado por representações que articulam espíritos (antepassados, peritos mortos) e ordem social (família, normas, respeito por proibições) e as suas terapias integram diferentes dimensões (sociais, espíritos, símbolos e medicamentos).
Existem, basicamente, quatro tipos de actores especializados no sistema de saúde: adivinhos (fazem adivinhação através de diversos sistemas divinatórios), curandeiros (tratam certas doenças através de diferentes tipos de técnicas e meios), médiuns (tratam certas doenças onde intervêm activamente vários tipos de espíritos), fazedores de feitiços (induzem alteração de forças).
Cada um dos três primeiros tipos de perito indicados pode acumular funções de dois ou mais tipos. Um adivinho pode ser curandeiro, um meduim pode ser também adivinho e curandeiro. Alem disso, cada um deste sabe diagnosticar ou tratar uma ou um conjunto de várias doenças, ainda que o diagnóstico e terapia não tenham que ser concordantes. E as causas diagnosticadas das doenças podem estar ligadas a vários tipos de fenómenos:
  • Incumprimento de normas sociais/familiares;
  • Castigo de espíritos antepassados por incumprimento de normas ou de proibições;
  • Agressão por um espírito de um defunto não familiar que não foi devidamente enterrado, porque pode exigir somas muito importantes e, nesse caso deve ser exorcizado; por ter visto ou ter participado actividades violentas e morte, sobretudo quando há derramamento de sangue e não existe iniciação ou a respectiva purificação.
O diagnóstico normalmente pode ser realizado através de adivinhação, ou por olfacto que detecta um espírito interveniente. São conhecidas terapias para múltiplas doenças (esterilidade, epilepsia, diarreia, herpes, dores de cabeça, doenças de pele e doenças venéreas).Os medicamentos para estas doenças derivam de plantas (folhas, cascas, raízes, sucos) que são indicadas pelos espíritos quase sempre através de sonhos e que são ministradas através de consumo (comida, bebida), de banhos com água quente (onde esses materiais estão misturados) para lavagem ou de baixo de um cobertor, para o doente suar.
No caso de epilepsia por exemplo, de acordo com a entrevista obtida com o médico tradicional no Sul de moçambique é denominada doença da lua e pode ser tratada por meio raízes como: xuidzila que juntam com pshissa, ximafamafama, ronfa, titi, pumbulo, juntam todas as raízes e fervem na panela de barro. E vão dando a criança 3 vezes ao dia. Por outro lado, Martins (2008:291), refere que a epilepsia não tem cura, mas há medicamentos que são usados no tratamento do peque mal epiléptico de modo a evitar que se transforme no grande mal. Há também outros medicamentos que fazem com que os ataques diminuam, ou, pelo menos, que sejam espaçados. Esse tratamento é para toda vida e é feito através de fármacos.
Além dos medicamentos, são exigidos tratamentos simbólicos, que se articulam mais com o social ou familiar, com os espíritos e com actividades mágicas.

Para Feliciano (s/d) coexistem em Moçambique dois sistemas de saúde, um dito tradicional e outro convencional. O primeiro reclama-se de uma legitimidade que assenta na sua eficácia físico-química, social, simbólica e espiritual, o segundo reclama-se de uma legitimidade científica do conheciemnto experimentado da físico-química. São dois sistemas paralelos com meios muito diferentes, mas que por força das circunstância, se vão cruzando.

5. Discussão das ideias


Temos que encarar a doença como um fenómeno biopsicossocial, e perceber que ela não se constitui numa entidade isolada, mas sim num todo. O primeiro local no qual devemos nos centrar é a família. A família foi e sempre será a base do desenvolvimento e o seu bem estar. E quando o indivíduo está doente, a família também fica doente, e a melhor maneira de de medir o estado de saúde do indivíduo acaba sendo medir a saúde da família. Sendo assim, quando a família não está bem, o indivíduo não esta bem e vice-versa.
Por outro lado podemos dizer que a sociedade é apenas um reflexo da família e quando o indivíduo não está bem a sociedade também não está bem. A sociedade é a consequência da família e o resultado da família uma vez que esta mesma sociedade é apenas constituida por família.
Além disso, é importante considerar as experiência, os pensamentos, as emções, expectativas de cada indivíduo.





















6. Conclusão


Devemos considerar a doença como a totalidade do indivíduo em termos orgânicos e psíquicos, o psicólogo é o resultado da história e da evolução do indivíduo, temos que considerar as experiências passadas do indivíduo e as suas vivências no presente como uma unidade sem conflito, tendo em conta que o passado promove o presente e o torna possível.
Uma doença não influencia só indivíduo mas sim todas as pessoas que estão em contacto com ele pois ela não tem apenas consequências biológicas mas psicológicas, sociais (isolamento, preconceito inquietação) e as quais provocam muitas vezes mudanças no sistema sociais. É por esta razão que o indivíduo é visto como um ser bio- psico- social e espiritual e a doença da mesma maneira.
Observamos que o que se faz com o doente mental na psiquiatria é no máximo dar-lhe um diagnóstico de doente, e submete-lo a um tratamento no modelo médico.
Por outro lado a saúde deve ser vista como um recurso para a vida diária na medida em que enfatiza recursos pessoais e sociais e as aptidões físicas. Caracteriza-se pela integridade fisiológica e psicológica, pela capacidade de desempenhar pessoalmente funções familiares, profissionais e sociais, pela habilidade de tratar com tensões físicas, biológicas, psicológicas, e sociais com um sentimento de bem estar e livre do risco de doença ou morte expontânea. Em suma, podemos referir que a saúde é um estado de equilíbrio entre os seres humanos e o meio físico, biológico, psicológico e social.









Referências Bibliográficas

Albuquerque, C. M. S. & Oliveira C. P. F. (s/d). Saúde e Doença: Significações e Perspectivas em Mudança. Disponível em http://www.ipv.pt/millenium/Millenium25/25_27.htm
Assis. E. (s/d). Introdução à epidemologia: Modelo de Saúde-Doença.
Feliciano, J. F. (s/d). A eficácia simbólica nos sistemas tradicionais de saúde. In Kotanyi, S. (sd). EspiritroCorpo. Lisboa – Portugal
Gonçalves, A. M. (s/d). Educação, ciência e tecnologia. Disponível em http://www.ipv.pt/../12.pdf
Martins, H. (2008). Manual de educação para a saúde. Maputo: Ministério da Saúde
Mwamwenda, T. S. (2005). Psicologia educacional: Uma perspectiva africana. 1ª Ed. Moçambique: Textos editores
Ribeiro, P. R. M. (1996). Saúde mental: Dimensão histórica e campos de actuação. 1ª Ed. São Paulo: EPU

Santiago, J. C. (2006). Doença e Sofrimento. Disponível em http://www.jcsantiago.info/doenca.html

Santos, L. M.(s/d). Tópicos da teoria psicanalítica freudiana. Disponível em http://www.cefetsp.br/edu/eso/filosofia/topicosfreud.html  
Peixoto, A. F. (2008). O olhar da psicologia: Freud e o inconsciente. Disponível em

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